Friday, May 06, 2016

E Depois da Mudança?

Na última posta aqui, despejei um manifesto muito pessoal sobre o acto de mudar, na véspera de avançar para uma das grandes mudanças da minha vida - e assustadora - e agora quero falar sobre aquilo que acontece depois de começarmos a mudança. O que é que muda realmente? O mundo acaba? Começamos a voar por nos sentirmos tão leves? Estamos iluminados e atingimos a felicidade eterna enquanto estamos cá, na Terra? O exagero atrás serve para mostrar o exagero do medo. Temos tanto medo que nos impede de avançar, de tentar, porque só entendemos extremos. Só reagimos ao tudo ou ao nada. Não conhecemos o equilíbrio, não sabemos o que é isso, porque também não é isso que nos ensinam durante toda a vida. Não culpo os nossos pais, coitados, tão ou mais vítimas que nós de uma sociedade que quer consumo e igualdade, estupidificação para não haver contestação, para que aceitemos aquilo que está na mesa, aquilo que nos é empurrado pelos sentidos abaixo e adentro.

O que é que muda depois da mudança afinal?

Quando decidimos que já estamos fartos do tudo ou nada, quando já não conseguimos aguentar o histerismo e a futilidade do que os mass media considera importante e quando nos desligamos de tudo e de todos, o que é que muda?

Nada.

Porque o desequilíbrio está dentro de nós. Não adianta procurar o equilíbrio fugindo das pessoas, dos empregos ou seja do que for quando por natureza temos algo que nos desequilibra, algo que nos inquieta, que nos irrita. Raiva, mágoa, dor, inveja, tristeza, depressão. O problema não é do mundo, o problema é nosso. O mundo apenas é aquilo que fazemos dele e o que fazemos dele é uma fábrica trituradora de ossos e carne daqueles que não aguentam o ritmo. Sem tempo para pensar, sem tempo para sentir, sem tempo para nós, para os que amamos. Sem tempo... para viver. E para quê viver? Trabalhar até à exaustão, não conseguir fazer mais nada depois de nove, dez, onze, doze horas fora de casa. Chegamos a casa ao nosso refúgio e afogamo-nos no facebook a ver pedaços da vida dos outros ou fazemos zapping, a passar de canal em canal e a não conseguir parar, porque nós não fomos feito para programar. A vida corre muito depressa, e corremos o risco de a ver passar ao lado. 

O que não nos disseram é que não é por corrermos atrás da vida que ela não é desperdiçada. A vida é vida. Não há manual, não há certos e não errados. Não há uma legislação, não há sucesso e não há fracasso. Ainda assim insistimos em seguir de forma obediente as regras que nos são instruídas, o controlo que diz que devemos fazer isto ou aquilo, a trocar o tempo por dinheiro que já gastámos antes de o receber e a ficar cada vez mais endividados até não termos mais tempo, nem dinheiro e nem saúde.

Depois da Mudança, ficamos nós. Sem guias, sem orientações. Apenas aquilo que sentimos e achamos correcto. É assustador, é libertador. A diferença é que agora, só nos podemos culpar a nós próprios mas antes isso do que estar sentado no sofá a dizer mal da vida porque temos o mesmo emprego há vinte anos e nos sentimos esgotados, escravizados, sem energia, sem vida, porque apenas fizemos o que nos disseram que era suposto fazermos.

A única coisa que é suposto fazermos é viver, sabendo que não é preciso chegar a um ponto de esgotamento nervoso para sabermos que precisamos de paz nas nossas vidas ou que não é preciso nos entupirmos de comprimidos para dormirmos o dia todo para que dar valor a sermos activos, a correr, a fazer exercício. Não precisamos de muletas e não precisamos de mudar o que somos, apenas temos que mudar aquilo em que nos tornaram, aquilo que nos deixámos tornar.

E aí seremos nós próprios pela primeira vez em muito tempo.

Sunday, December 13, 2015

Manifesto sobre o acto de mudar

 Mudar de vida. Esta declaração é algo constante nas nossas vidas, muitas das vezes até talvez dita de forma leviana. Ou pelo menos é assim entendida, porque aquilo que é feito é bem diferente daquilo que é dito. A verdade, crua e dura, é que estamos numa sociedade que nos deixa poucos espaços para mudanças. Numa sociedade onde é mais importante aprendermos naquilo que poderá dar mais dividendos financeiros do que propriamente naquilo que gostamos – um dos graves problemas do nosso sistema de ensino, entre muitos. Então sentimo-nos presos. E dizemos ao mundo, aos amigos ou apenas a nós próprios, que queremos mudar de vida.

Mas não fazemos nada. E nada muda. A não ser que a mudança que algo apareça, que algo aconteça.
Desde hábitos, forma de estar até ao emprego, para tudo aquilo que não gostamos a mesma linha de acção: unicamente dizer “tenho que mudar de vida”. Projectamos para o futuro esse acto porque no presente não acreditamos que isso possa acontecer. No presente não sentimos que tenhamos força para tal. E colocamos aquilo que deve ser a nossa tarefa nas mãos de algo indefinido e incerto como o futuro. Recusamo-nos a viver no presente e ansiamos por um futuro que à partida colocamos como inalcançável. Por medo do que mudar de vida representa, por medo de perder o conforto que achamos que não podemos viver sem. Se fôssemos a traduzir palavras por imagem, seria como não querer deixar a prisão apenas porque a cama tem colchão.

Vivemos em prisões mas antes de culpar a sociedade, o governo, o ensino, o patrão do emprego que odiamos, na verdade temos que nos culpar a nós próprios porque a porta da prisão está aberta. Apenas acreditamos na ilusão de que a mesma está fechada, tapada por vários medos que temos. Então precisamos sempre de coisas exteriores que nos salvem dessa prisão. A nossa ideia de mudar de vida passa exclusivamente pela necessidade em ganhar o euromilhões, como se uma quantidade obscena de dinheiro fosse o suficiente para nos dizer o que quereríamos fazer na vida. Na verdade, aquilo que o euromilhões permitiria imediatamente seria libertar da prisão na qual nos sentimos presos no quotidiano.

E saíssemos da prisão? Não procuraríamos por outra onde nos sentíssemos agradavelmente e confortavelmente adormecidos? É uma questão que certamente provoca um longo debate e com variadas opiniões. Aquilo que é importante reter é que a prisão onde sentimos que estamos a cumprir pena, foi construída por nós próprios. Uma prisão de medo do futuro, insatisfação pelo presente e sentimento de perda pelo passado.

A chave para libertar da prisão começa por viver o agora. O mudar de vida começa agora. Por agir da melhor forma com aquilo que somos, com o viver ao máximo a nossa expressão como seres individuais com qualidades e defeitos únicos. Permitir-nos a aceitar o dia de hoje como o ponto de partida para a mudança que tanto precisamos e queremos. Não como uma fuga do presente, mas como início do caminho para aquilo que somos.

A mudança começa agora.